O fim da Escola de Engenharia como a conhecemos

21/08/2012 - O fim da Escola de Engenharia como a conhecemos

José Roberto Cardoso
Diretor da Escola Politécnica da USP
 
Em 1999, a Profa. Denise Consonni propôs uma disciplina para o segundo ano da Engenharia Elétrica da Escola Politécnica da USP, na qual os alunos deveriam realizar um trabalho, sob orientação. Esperavam-se trabalhos simples, como aqueles realizados para as feiras de ciência. Não foi o que aconteceu. A qualidade dos trabalhos superaram todas as expectativas. Os recursos de técnicas avançadas de simulação, telemetria, controle e automação foram aplicados com frequência nos projetos.
Um ex-aluno, hoje engenheiro eletricista, durante a graduação fez parte de um grupo de estudos, cujo objetivo era participar de uma competição de aeronaves guiadas. Sua responsabilidade no projeto era avaliar a dinâmica de voo, com simulações numéricas sofisticadas, para otimizar o consumo de combustível e a capacidade de carregamento da aeronave. O chefe da equipe à época era um aluno do curso de Engenharia Naval e Oceânica, e os demais membros oriundos de diversas modalidades da EPUSP. Não faziam parte do grupo alunos com especialidade em Engenharia Aeronáutica e, ainda assim, o grupo ganhou vários prêmios nas competições nacionais e internacionais que participou.
Outro estudante, egresso do curso de Engenharia Metalúrgica, aproveitou o programa de internacionalização da EPUSP para realizar parte do seu currículo em uma grande escola italiana. Voltou para o Brasil. Concluiu seu curso e se dedicou aos estudos da Economia e Desenvolvimento pelos quais se apaixonou durante seu estágio italiano. Hoje trabalha na Guiné-Bissau, para uma empresa americana, na condução de um projeto de Gestão Pública.
Os relatos desses três casos são emblemáticos. No primeiro, por se tratar de uma disciplina inicial, observa-se que os trabalhos realizados pelos estudantes utilizam-se de técnicas e metodologias que serão a eles apresentadas apenas nos semestres finais de seu curso e, em muitos casos, tais técnicas são apresentadas somente em cursos de pós-graduação. Projetos envolvendo a utilização de técnicas de otimização, métodos numéricos sofisticados e utilização de novos materiais são comuns nesta disciplina, o que mostra que os alunos “aprendem fazendo” e não seguindo uma sequência lógica de aprendizado tradicional. Isso atesta que o aprendizado não é uma linha de montagem, e não precisa ficar preso a uma cadeia rígida, repleta de pré-requisitos.
O segundo caso mostra que a habilitação escolhida pelo estudante não limita sua capacidade de desenvolver um trabalho de qualidade em habilitações distintas daquelas escolhidas no início de sua vida acadêmica. A escolha de uma carreira é irrelevante para o sucesso intelectual. São inúmeros os exemplos de engenheiros que se tornaram brilhantes profissionais em outras áreas do conhecimento.
O terceiro caso mostra como é volátil a preferência de um estudante por uma determinada profissão. Basta dar a ele oportunidades de tomar contato com outras carreiras, para que a fidelidade a sua preferida seja colocada facilmente em cheque. A flexibilidade e a mobilidade curricular devem ser partícipes de sua formação.
Em vista destes exemplos, será que não precisamos refletir sobre o papel da universidade na formação de nossos jovens, em particular de nossos jovens engenheiros? O que fazer para navegar de uma estrutura rígida e cristalizada, que nos confina em silos, para uma estrutura flexível e moldável, na qual a especialização seja substituída pela visão sistêmica de um problema.
A evidência maior tem mostrado que a multidisciplinaridade é a chave da inovação e da criatividade. Esta postura, inicialmente praticada pelas universidades americanas, foi assumida há anos pelos europeus e asiáticos, para tentar recuperar o terreno de sua influência mundial.
A participação das artes, do design, das ciências biomédicas e das ciências políticas, deverá transitar nos currículos modernos das engenharias se quisermos ver nossos jovens engenheiros com competência criativa e de liderança, e que sejam capazes de nos colocar na posição mundial que imaginamos estar.
Concluindo, cabe a nós criar em todas as escolas de engenharia um ambiente único, com todas as facilidades para que o estudante possa por a “mão na massa”, onde todas as ideias fluam livremente, isentas das pressões acadêmicas, e que seja frequentado por estudantes de outras áreas, para que desta “promiscuidade” acadêmica floresça a criatividade.
 
Acadêmica Agência de Comunicação
Assessoria de imprensa da Escola Politécnica da USP

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