Parceria público-privada no setor de saneamento: o modelo que vem dando certo¹

16/07/2015 - Parceria público-privada no setor de saneamento: o modelo que vem dando certo¹
 
Por José Eduardo Cavalcanti*
 
Não trata este artigo propriamente de assuntos ligados a uma PPP, moderna modalidade de associação entre os setores público e privado para a implantação de grandes projetos.
Mas, efetivamente, a mais antiga forma de parceria público-privada que ao longo dos anos tem se revelado eficaz é aquela cujos atores são representados, de um lado pelas empresas privadas de consultoria, planejamento e projetos em saneamento básico, e do outro pelos órgãos públicos responsáveis pela implantação de estruturas de saneamento do meio envolvendo sistemas de abastecimento de água, tratamento de esgotos e resíduos, drenagem, bem como pela gestão de recursos hídricos.
Esta parceria tem sido aplicada com sucesso nas diversas esferas de governo, incluindo companhias estaduais de saneamento e autarquias municipais encarregadas dos serviços de água e esgotos.
Iniciada nos anos 1950, esta parceria teve seu auge na época do Plano Nacional de Saneamento (Planasa) implantado nas décadas de 1960 e 1970, ocasião em que foram criadas no âmbito de cada estado da Federação as empresas de economia mista de saneamento que foram responsáveis pela universalização do abastecimento de água em praticamente todo o país, graças à implantação de um modelo independente de gestão, muito mais ágil do que aquele praticado até então pela administração direta, e a um mecanismo efetivo de financiamento muito bem coordenado pelo extinto Banco Nacional de Habitação (BNH).
Nesta época, se expandiram empresas de consultoria e projetos de saneamento, atraídas pelo grande mercado que se avizinhava fruto da seriedade com que era tratado este setor. Jovens engenheiros e tecnólogos eram procurados avidamente tão logo se formavam para compor os quadros das firmas de consultoria e também por empresas estatais de saneamento onde eram treinados por um corpo de profissionais sanitaristas experientes advindos das universidades e das antigas autarquias que historicamente eram as responsáveis por tais serviços. Atualmente, da ordem de 2 100 profissionais estão em atuação, desenvolvendo serviços nas áreas de planejamento, concepção de sistemas, detalhamento de projetos, acompanhamento e gerenciamento de obras.
Neste contexto, tem sido notável o papel representado pela Cia. de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), principal companhia de saneamento do país, junto às empresas de consultoria de São Paulo e também de outros estados, que mesmo após o término do Planasa continuou sendo a responsável por demandar estudos e projetos diversificados e sofisticados.
Contudo, tal cenário vem se alterando, com a surpreendente redução da demanda. Embora tenha sido grande o esforço empreendido pela Sabesp na expansão dos serviços de saneamento em todos os municípios que atua, refletido nos investimentos realizados nos últimos anos, os mesmos tiveram sensível redução a partir de 2013, provavelmente reflexo da situação econômica por que passa o Brasil, agravada em 2015 pela atual crise hídrica sem precedentes que nos assola.
Assim sendo, é preocupante a paralisação e descontinuidade de novas contratações, sobretudo as representadas pelos serviços de consultoria e projetos, capazes de fornecer suporte ao esforço de planejamento no equacionamento das soluções propostas em caráter de urgência, propugnadas pelo governo paulista, bem como àquelas outras que se afiguram pertinentes no médio e longo prazo.
Ademais, o incremento da participação das empresas de consultoria no detalhamento dos projetos e no acompanhamento da execução das obras nos processos em andamento trará maior transparência às ações que estão sendo empreendidas pela Sabesp. Deve ser enfatizado que os investimentos em obras, materiais e equipamentos, os custos de consultoria e projetos do setor representam uma parcela de apenas 5% do total.
Por outro lado, a descontinuidade em termos de investimentos que deem suporte à sobrevivência destas empresas, com certeza trará prejuízos inestimáveis para a engenharia nacional, com o colapso do setor de consultoria e projetos, justamente em um instante que a crise hídrica vem a exigir do poder público uma revisão do planejamento e de premissas que irão requerer por consequência um grande esforço da engenharia nacional. Como em outras épocas que o setor já viveu, quando os investimentos sofreram grande redução, muitas empresas não sobreviveram e parte considerável dos profissionais migrou para outras áreas desfalcando um valioso patrimônio em termos de conhecimento técnico. Essa situação só foi revertida anos depois, à custa de muito sacrifício e grande perseverança dos profissionais e empresas remanescentes do setor.
Não podemos nos dar ao luxo de desarticular novamente o setor de consultoria em saneamento, sob a pena de perdermos de forma inexorável as equipes técnicas dotadas de profissionais altamente qualificados e especializados nas diferentes áreas em que atuam, constituindo hoje um acervo inestimável para toda engenharia nacional e representando uma força de trabalho com elevado know-how.
 
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* José Eduardo Cavalcanti é engenheiro, presidente do Grupo Ambiental, membro do Conselho Superior de Meio Ambiente da Fiesp, e conselheiro do Instituto de Engenharia
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¹ Publicado na Revista Engenharia, edição 625-2015 – www.brasilengenharia.com

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